When you're with me maybe the skies will be blue...
Ele vivia sem rumo.
Ela tinha-se perdido pelo caminho.
Ele era sarcástico, cínico, aparentemente arrogante e nunca tinha tomado tempo para crescer.
Ela era bastante mais do que aparentava ser. Fria por fora e eternamente romântica por dentro, divertida e politicamente incorrecta. Parecia estar bem sozinha mas procurava eternamente aquele alguém.
Ele era também um romântico. Vivia a saltar de paixão em paixão sempre sem rumo ou padrão algum. Entre a euforia e a depressão bastava apenas um passo.
Conheceram-se um dia por amigos mútuos. Não se causaram grande impressão. Ela não se deu ao trabalho de criar conversa, ele estava tão absorvido em chamar para si todas as atenções que nem reparou no seu nome. A estória podia acabar aqui.
Contudo, eram colegas de faculdade. Durante um semestre inteiro apenas se cumprimentavam. Tinham um grupo comum de amigos mas o seu interesse um no outro era nulo. Um dia, numa dessas saídas, lá estavam os dois, ao pé um do outro e no entanto sem sequer se notarem. Ele estava assanhado. O inverno e algumas semanas sem sociabilização tinham-no deixado em baixo. Saiu à procura de alguém. Ela... Nem ela sabia o que queria. Contudo, como tudo aquilo mais elaborado no mundo, algo encaixou naquela noite. Não se falaram, nem sequer trocaram mais do que um olhar. Cumprimentaram-se, divertiram-se e despediram-se.
Ao dormir naquela noite ele sonhou com ela. Acordou satisfeito, bem mais satisfeito do que estivera em muito tempo. Bem mais satisfeito do que se tinha sentido com muitas das relações em carne e osso que havia tido recentemente. Contudo, não havia sido mais nada do que um sonho. O facto de não a conhecer havia-lhe permitido criar na imagem dela a personalidade da rapariga para ele perfeita. Tudo aquilo não significava nada.
Por algum motivo, ele não desistiu. Arranjou por terceiros o e-mail dela. Nada mais fácil. Persuasão era algo que lhe vinha naturalmente. Sentando-se na secretária, começou a escrever-lhe uma mensagem. Duas horas depois tinha sido enviada. Duas horas e oito minutos depois recebeu uma resposta.
“Amanhã pelas nove tomamos um café”
Tão directo como isto, tão simples como isto.
O efeito que tal mensagem lhe provocou foi avassalador. Pela primeira vez em vários anos sentiu receio e timidez. Pela primeira vez em muitos anos arrependeu-se de ter dado aquele passo.
Encontraram-se no café. Trinta minutos de conversa constrangedora, carregada de silêncios. Já tomado o encontro como arruinado, já bastante desconfortavel, em tom de desabafo e exasperação ele exclamou algo como:
“Desculpa estar pouco falador, estive no dentista há umas horas. Já não bastava o facto de pagar para me usarem a boca como recreio, ainda tive de esperar uma boa hora até ser atendido. Benditas sejam as revistas das salas de espera.”
“Revistas?”-perguntou ela franzindo o sobrolho.
Claro, respondeu ele, toda a gente lê revistas nos consultórios. Bem se tenta contrariar a tendência, pondo televisões, plantas, jornais e outros objectos passiveis de atraír a atenção às pessoas, mas a verdade é que, na sala de espera imperam as revistas. Sobre todos, da leitora compulsiva até ao mais erudito dos sábios. Pode nunca ter tocado uma dessas revistas, pode pertencer a uma seita cujo objectivo é expurgá-las da face da terra. Na sala de espera ninguém escapa ao domínio da revista cor-de-rosa.
As duas horas seguintes foram passadas em expeculações e argumentações sobre esse tema. As duas semanas seguintes em conversas e constatações sobre tudo e sobre nada.
Os dois meses seguintes foram um sonho. Ela era em muitos aspectos o seu equivalente, noutros ultrapassava-o. Juntos riam-se do mundo.
O fim da estória ainda não foi escrito. Como em tudo as possibilidades são infinitas.
O seu inicio foi uma mensagem mandada por causa dum sonho tido sob o efeito do alcool.
Esta foi a mensagem. Fui eu quem a escrevi.