Vida
Há uma razão para nós não nascermos automaticamente adultos. E quando se diz uma quer-se dizer, é claro várias...
Temos,claro, para começar o aspecto físico. A grande vantagem de se nascer pequenino e desprotegido é que toda a gente gosta de nós e nos quer bem. De repente começamos a existir e imediatamente o panorama é "tão fofinhoooo", "bébé qué comê?", "anda cá... anda cáaa". Uma breve análise do mundo em nosso redor rapidamente indicaria que se nascessemos na nossa fase adulta (ou, Deus não o permita, na nossa fase adolescente) seria muito pouco provável encontrar alguém que nos achasse minimamente interessantes e atractivos. O resultado seria provavelmente uma quantidade grande de gente estúpida morta.
Porém, o factor de maior importância de se nascer sub-desenvolvido é que nos dá tempo para organizar as ideias. Não sendo necessário o uso de grande raciocínio durante os nossos primeiros anos, nós de bom grado assim o fazemos e ocupamos o nosso tempo a obter impressões sensoriais para bastante mais tarde nos darmos ao trabalho sobre elas.
Assim, o nosso bébé comum tende normalmente a ter a sua atenção capturada por movimentos e objectos que não se enquadrariam normalmente no nosso raciocínio. Uma folha perfeitamente normal cai de uma árvore e rapidamente eles são levados a paroxismos extremos de confusão, o nascer do sol apanha-os completamente de surpresa todas as manhãs, mas um elefante passa a meio metro deles a fazer malabarismo com três caçadeiras de cano serrado e pura e simplesmente não consegue chamar a sua atenção.
Isto, embora depois de atingirmos a maturidade sensorial possa parecer quase patético, é uma melhoria consideravel ao que seria se de repente fossemos colocados ao mundo na nossa fase racional.
Sem mais delongas, o homem-recém-nascido.
"O que está a acontecer?"- pensou ele.
"Peço desculpa, quem sou eu?"
"Olá?"
"O que estou eu a fazer aqui? Qual é o meu objectivo?"
"O que quero eu dizer com quem sou eu?"
"Ok... Calma... Tenho de me controlar... oh! Isto é uma sensação interessante na minha- bem, se calhar é melhor eu começar a dar nomes às coisas que for encontrando se é que que quero fazer algum ao que eu chamarei progresso no que eu chamarei de mundo- por isso vou chamá-la de barriga. Hmmm... Bom... Está a ficar bastante intensa esta sensação... E o que será este barulho assobiante e forte que sinto a passar pelo que passarei a chamar de minha cabeça? Se calhar o melhor é chamá-lo vento! Será isso um bom nome? Deve servir... Talvez mais tarde lhe encontre um nome melhor quando descobrir para que é que ele serve. Deve ser bastante importante, tendo em conta a quantidade dele que há por aí."
"Hey! O que é isto? Vou chamar-lhe pilinha. Sim, pilinha. Hey! Consigo abaná-la muito bem não consigo?!Wow! Wow! É tão interessante! Não parece ter nenhum propósito mas mais tarde descubro para que é que serve! Bem... Já alcancei uma imagem coerente das coisas?"
"Não."
"Deixa lá... Na verdade isto é bastante excitante. Tanta coisa para descobrir, tanta coisa para antecipar... Na verdade até estou tonto com a excitação!"
"Ou será o vento?"
"Há mesmo uma enorme quantidade disso não há?"
"E.. wow! O que é aquela coisa a vir na minha direcção muito rapidamente? Tão rápida!! É tão grande e plana e verde, precisa de um nome importante e imponente. Hmmm...ã... ão...cão.... chão!! É isso!!! É um óptimo nome: chão! Será que ele quer ser meu amigo?"
E o resto, a seguir a um baque doloroso e surdo, foi silêncio.
Ok... Admito que os homens, mesmo que nascendo adultos, não costumam nascer a cair de ravinas.
Enfim.